VALORIZAR O CONTEÚDO, PARA TER O QUE ENTREGAR
Se você tem criatividade, iniciativa, gosta de fazer
acontecer, agora tem mais um motivo para comemorar. A Suprema Corte Americana
proclamou uma decisão, há poucas semanas, que consagra o direito dos criadores
de conteúdo receberem pelo que produzem. Na prática, o que se viu foi a
"Bald Eagle" - a águia de cabeça branca, símbolo dos Estados Unidos -
cortando as asinhas de uma startup que se proclamava autora de uma nova
tecnologia.
Se você mora no Brasil, vai ter alguma dificuldade para
entender a história toda. É que o sistema brasileiro de TV é mais avançado e os
modelos de negócio no setor também são mais práticos e eficientes. Lá, nos
Estados Unidos, a televisão arrasta um passivo tecnológico dos tempos em que o
sinal de TV por radiodifusão ainda era sujeito a muitas interferências. Foi por
isso que os americanos criaram a TV a cabo. Em princípio, garantiu apenas um
sinal de alta qualidade para os assinantes. E, com o tempo, foi agregando
melhorias, como a inclusão de vários canais opcionais, contratação de
programação especial e outras vantagens. O hábito pegou e hoje oito, a cada dez
lares americanos, contratam o sinal de TV por assinatura, via satélite ou cabo.
Para eles é o melhor que podem fazer pelas 5 horas do dia em que se entregam a
este lazer eletrônico. Uma recente pesquisa apurou que esse é o tempo, em
média, que o adulto americano assiste à TV diariamente.
Qualquer pessoa há de convir que, ter o endereço dos olhos e
ouvidos do consumidor mais poderoso do mundo, é uma oportunidade e tanto. Mesmo
sabendo que só parte do cérebro também estará no mesmo lugar durante esse
tempo. Mas, por incrível que pareça, quem não tem a exata consciência de quanto
vale a própria audiência é o público americano. Ele paga para receber em casa,
inclusive, muitos anúncios de empresas, que também pagam caro aos exibidores
por esta presença comercial. É verdade que existe a opção, por vezes exercida,
de não receber os comerciais. Mas também é verdade que o intervalo comercial é
um detalhe que já faz parte do hábito de assistir à TV. Além de criativo é
útil, os anúncios trazem informações, pelo menos nas primeiras exibições.
Depois acabam se tornando oportunos pra esticar as pernas e pegar um copo de água na cozinha.
A questão é que essa sede insaciável de cobrar pelo sinal de
TV levou a startup Aereo a inventar uma maneira de vender os canais de TV aberta, sim,
os gratuitos. Ela gravava a programação das TVs abertas e deixava numa nuvem
digital, assim, como quem não quer nada. Depois oferecia, por reles US$
8,00/mês, a programação para assinantes, que poderiam conectar a nuvem de qualquer
lugar. Para isso a empresa mantinha, em cada cidade que operava, um espaço onde
ficavam as antenas dos assinantes, que captavam o sinal da nuvem e recebiam
pela Internet. Ora, e o pagamento pela exibição pública dos conteúdos?
"-Conteúdo!? Que conteúdo? Nós só alugamos antenas", disseram os
donos da Aereo na Suprema Corte Americana. "-E para que servem as antenas
afinal?", retrucaram os magistrados. "-Sei lá, o locatário é quem
sabe, é ele quem escolhe se quer ver o que gravamos na nuvem ou não." O preocupante nessa história é que apenas 6, dos 9 juízes, condenaram a Aereo. Foi
o suficiente para a empresa fechar as portas e devolver o dinheiro dos
assinantes. Mas a gente fica pensando o que fez 3 juízes não gargalharem dos
argumentos da startup.
Eis o grande contrassenso da humanidade! Nos últimos anos,
desenvolver tecnologias de cópia é um negócio muito mais rentável do que
desenvolver conteúdos. Só que é o bom conteúdo que convence, na forma em que for
apresentado. É ele que atinge a essência da inteligência humana para gerar
reações que constróem culturas, ciência, vidas. Já a cópia é simplesmente um
eco. Importantíssimo, claro, mas irremediavelmente dependente do conteúdo, da
criação.
O Brasil agora se prepara para um passo histórico na
tecnologia de TV no mundo: são os "conteúdos cidadãos". O governo
acaba de determinar que os set-top box, que vão ser distribuídos pelas
operadoras de celulares aos 14 milhões de lares do bolsa família, tenham o
software Ginga com plena capacidade de interatividade. É um passo fundamental!
Os aparelhos vão ser entregues como compensação das operadoras aos brasileiros
que vão perder o sinal analógico por antecipação. Por isso não haverá custos
para os cofres públicos. Com essa imensa plataforma de comunicação que o
governo vai criar com a TV digital, ficará disponível o potencial para
prestação de serviços via TV, como consulta de saldo do FGTS, contagem de
aposentadoria, informações do ProUni, agendamentos para o SUS e muitos outros
serviços públicos. Falta apenas colocar os ministérios para programar, o que
representa um custo insignificante. A burocracia federal, falando em Ginga,
pode aumentar muito a eficiência dos serviços públicos e o atendimento à
população. Tudo de graça!
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