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O palco do acontecimento não poderia ser um lugar mais glamouroso. O MWC 2022 – Mobile World Congress é a maior exposição e o maior fórum de discussões da indústria móvel no mundo. Aconteceu nesta semana, em Barcelona, e deu lugar ao evento brasileiro de maior importância deste ano para o setor. 

O ato em si, ocorrido no estande do Brasil, em princípio não pode ser considerado tão bombástico. Os atores envolvidos é que fazem a grande surpresa. Algo inimaginável há 6 meses, quando por aqui ainda preparavam o leilão de frequências para o 5G. Por sinal, o maior já realizado no mundo até agora. O que aconteceu na última terça-feira na MWC 2022 foi a assinatura de uma proposta que reúne o governo federal, uma associação científica brasileira e uma empresa privada. O objeto é o desenvolvimento de tecnologias para o 5G e para inteligência artificial.


O governo federal esteve representado pelo astronauta Marcos Pontes, Ministro da Ciência e Tecnologia que, até 2020, também acumulava a área de Comunicação. A Softex – Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro, ligada ao ministério de Pontes, é a parceira científica. E a empresa privada é a gigante chinesa Huawei, banida dos Estados Unidos e alvo de uma ação diplomática da Casa Branca, contra o uso dos equipamentos que ela produz para a atual geração de Internet móvel. A acusação americana, levantada por Donald Trump, é de que os equipamentos dela são preparados para espionar outras nações, em favor do governo chinês.


O então colega brasileiro de Trump, já declarado amigo pessoal, assumiu de pronto a posição esperada pelo americano. Jair Bolsonaro disse que não aceitaria os equipamentos da Huawei no 5G brasileiro. Exceção difícil, uma vez que a marca é a mais presente nas redes de telecomunicações por aqui. A posição foi alcançada ao longo de 24 anos, por critérios absolutamente empresariais, como qualidade e custo. Com a vitória de Biden, Bolsonaro se distanciou do governo americano, embora o representante do partido democrata tenha mantido a mesma política em relação à tecnologia chinesa. O presidente brasileiro tentou afastar os “riscos” que os equipamentos mandarins suscitavam. Decidiu que toda a comunicação entre os órgãos do governo federal estará ligada em rede privativa. O efeito protetivo que se espera pode não ser maior do que o obtido através de outras técnicas, como criptografia, usadas numa rede aberta comum.


Embora não haja ainda um posicionamento da parte do presidente, a fala do ministro Marcos Pontes aos jornalistas foi clara: "-Do meu ponto de vista, esse negócio ficou para trás". E completou dizendo que "... quando eu era ministro de comunicações, a minha opinião sempre foi de analisar o mercado pensando em reforço de segurança cibernética". O presidente da Huawei no Brasil, Sun Baocheng, surfou nessa onda e garantiu que não existem conflitos entre o governo e a empresa que ele representa.


Para muitos o fato pode parecer a superação definitiva das rusgas que Trump plantou por aqui. Até em função do ano eleitoral, a adoção da tecnologia chinesa se justifica. O 5G, pelo menos nas capitais do Brasil, é uma promessa a ser entregue no palanque. Não há restrições quanto à marca, perante as operadoras que venceram o leilão. É a mais avançada do mercado, tem os melhores preços. Mesmo assim, convém pôr as barbas de molho. De acordo com o site Tilt, do portal UOL, Pontes afirmou que não sabe o que o Ministério das Comunicações – agora ocupado por Fábio Faria – tem a dizer sobre o mesmo tema. O astronauta vai deixar o governo para concorrer a uma cadeira de Deputado Federal pelo partido do presidente. E Fábio Faria, que vai continuar no governo, não passou pela MWC.


As escolhas empresariais no mundo globalizado são um tanto cosmopolitas. As lições que vêm desse episódio se completam com o que o presidente está enfrentando por conta do potássio russo, em função da guerra na Ucrânia. Quando as demandas tecnológicas vão além de comodities e passam por projetos e componentes de ponta, a escolha é mais complicada ainda. Cada centavo pago, cada configuração possível, fazem toda a diferença para um serviço como as telecomunicações. Os riscos alegados são rastreáveis por instituições internacionais e mesmo brasileiras. Parece que a maior ameaça para o 5G brasileiro seria a adoção de uma tecnologia mais cara, menos eficiente e pouco conhecida no mercado. A pressão feita até aqui serviu para que a Huawei demonstre toda essa boa vontade, se abrindo para um intercâmbio tecnológico – pelo menos, aparentemente. E ainda, deve apressar a implantação da nova tecnologia. Afinal, tudo indica que nem a Huawei, nem as operadoras, querem correr o risco de esperar para ver o que vai acontecer a partir da nova gestão presidencial. O destaque fica para o velho ditado popular: “-Nunca despreze a persistência oriental”.

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