AINDA NÃO FOI DESSA VEZ




“Pra tudo tem um jeito.” O ditado popular é atribuído aos “antigos”, classificação de autoria que já caiu em desuso. Mas o ditado, não. Nesses tempos digitais o jeito se chama app e vai tomando conta de tudo.

A ciência explica. Os chips diminuem progressivamente de tamanho, enquanto os componentes parecem dar cria lá dentro. A cada nova geração são mais tantos milhões de resistores, diodos, capacitores... tudo ligado a processadores sempre mais rápidos. Daí o software vai escolhendo os componentes e montando os circuitos que precisa, como uma criança numa montanha de lego, que constrói seus brinquedos segundo a própria imaginação.

É assim que aparece software do tipo telefone, pra você falar de graça com o outro lado do mundo, tem também walkman, DVD e muito mais. Máquinas que sempre foram circuitos, baseados nos mesmos componentes, ainda que bem maiores. Já aconteceu com centrais telefônicas e os demais dispositivos de comunicação vão surgindo e se encaixando. Como, por exemplo, nas operadoras de telefonia móvel virtuais ou MVNO – mobile virtual network operator.

Esses sistemas podem distribuir e gerenciar, entre centenas de milhares de clientes, parte da capacidade operacional de uma rede. No Brasil, por exemplo, os Correios fizeram um contrato com a TIM para utilizar parte da capacidade da rede da operadora italiana. Até o mês retrasado já tinham mais de 110 mil chips vendidos. Ligações de voz, Internet, WhatsApp, sempre a preços mais em conta do que se contratados diretamente das operadoras.

É aí que está a explicação estratégica desse modelo de negócios. No chamado Primeiro Mundo e em vários países em desenvolvimento esse tipo de solução é adotado para gerar competitividade nos serviços de telefonia. As operadoras virtuais têm estruturas mais enxutas, menos caras e podem atender seus clientes com mais atenção, uma vez que numericamente são bem menos. Os governos apoiam, simplificando as exigências sobre essas pequenas operadoras.

No Brasil, a primeira operadora virtual móvel foi a Conecta Porto Seguro. Durante três anos seguidos foi escolhida a melhor operadora do país. Já contava com cerca de 700 mil clientes, mas anunciou esta semana que estará encerrando as atividades. Analistas entendem que o motivo foi o excesso de regulamentação. Quando é assim, não tem jeito.


ESPERAR É PRECISO


As MVNO são regidas pela Resolução 575 da Anatel. De acordo com essa legislação, as prestadoras de pequeno porte são aquelas que têm até 50 mil clientes, o que não era o caso da Conecta Porto Seguro. Isso significa que sobre ela recaíam praticamente todas as obrigações que as grandes operadoras têm de cumprir.

A própria agência, tacitamente, reconhece que se trata de um exagero. A Anatel está formulando atualmente o PGMC, o Plano Geral de Metas de Competição, que prevê um tratamento diferenciado para as ppps (prestadoras de pequeno porte). Pelo novo Plano, seriam as prestadoras com até 5% de participação no mercado. O market share da Conecta era de 0,31%.

O excesso de tributação também atrapalha. No caso dos sistemas MVNO é muito usado o M2M (comunicação entre máquinas), sobre o qual recaem impostos como se fosse uma conexão móvel doméstica. Um excesso que está ameaçando a viabilidade do IoT (Internet das Coisas), onde a comunicação entre máquinas é a razão prática dessa tecnologia. Por conta do interesse no IoT a agência estuda retirar tributos quando a conexão acontecer entre máquinas, o que reduziria o custo também para as MVNOs. Porém, assim como acontece com o PGMC, a nova regulamentação para M2M ainda está em estudos.

Informações do site Teletime dão conta de que o roaming internacional é outra dificuldade a ser resolvida, que continua pendurada na Anatel. Tudo isso coloca as prestadoras virtuais sob ameaça no Brasil. O que implica num baixo nível de competitividade para as telecomunicações, um serviço essencial para o desenvolvimento de qualquer nação.

Esses fatos, associados a um histórico de decisões polêmicas, imprime mais fortemente a pecha de “protetora das teles” àquela que deveria ser a agência reguladora desses serviços. E que deveria primar por uma ação voltada para a maior concorrência nos serviços, de forma a propiciar vantagens aos clientes.

Mais um desafio para o próximo inquilino do Palácio do Planalto. As agências reguladoras têm um papel fundamental num mundo em que o ritmo de inovação impõe mais agilidade e tecnicidade nas decisões governamentais. E, por enquanto, não parece que isso esteja acontecendo nas agências nacionais.


A ENTRADA PARA A SAÍDA


Certos vícios da administração pública brasileira estão pesando mais contra a população, que demora a perceber a mão invisível... do estado. Por exemplo, o expediente de inflar os impostos escondidos entre os itens preferenciais dos cidadãos. Um caso clássico são os carros, sobre os quais recai uma tributação muito pesada, que desequilibra toda a cadeia automotiva. O efeito é contaminante, pois desencadeia outros vícios entre montadoras e fornecedores de autopeças, gerando distorções que atingem em cheio o consumidor. A tributação sobre a telefonia também é excessiva. O Governo sabe que o povo gasta muito ali, então é lá onde a mordida vai ser mais voraz.

O sistema financeiro é especialmente pesado para a população. Tudo porque o governo é o principal tomador, algo em torno de 70% do volume de crédito. Ao mesmo tempo em que essa situação torna muito mais cômoda a vida dos bancos, traz muitas dificuldades para empreendedores, indústria, comércio e para a população em geral. O governo é um “cliente” que aceita pagar juros altos, então o povo – que é quem paga as contas do governo – também vai ter que pagar maior spread em suas operações.

Acontece que essas distorções estão se tornando insustentáveis. Num mundo que se renova em períodos cada vez mais curtos, é preciso investir mais, para inventar e produzir o novo em grande escala. Só assim vai ser possível competir em nível global. Quando o crédito é caro, o governo indeciso e enrolado, a inovação não acontece. Aumenta a dependência dos produtos importados, a população fica mais dependente do que acontece fora daqui, longe das novas influências.

O que é preciso fazer para sair desse círculo vicioso ninguém sabe ao certo. O que todos sabem é por onde começa. Se você ainda tem alguma dúvida, vai ter esse próximo domingo todo para refletir.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

OLHO NO LANCE!

QUESTÃO DE PRIVACIDADE

UMA VULNERABILIDADE PREOCUPANTE