POR QUE PAROU, PAROU POR QUE!?
A pressa era tanta que as empresas que operam a telefonia móvel no Brasil - as "teles" - estavam dispostas a gastar alguns bilhões de dólares para antecipar. Mas agora enxergam problemas em quase tudo. Trata-se da massificação do serviço 4G no Brasil, a quarta geração de Internet móvel. Se você já sabe como vai funcionar, ou se acabou de almoçar, pule os próximos três parágrafos e continue lendo a partir do quarto parágrafo. Agora, se tiver estômago para entender a confusão, siga para a próxima linha.
Para viabilizar o serviço em larga escala em todo o Brasil
as operadoras precisam utilizar a faixa de frequência de 700 MHz, que
atualmente é usada por parte das emissoras de TV. A liberação dessa faixa de
frequência exige novos equipamentos para as emissoras operarem em outras faixas
- a serem cedidas pelo governo - no padrão digital. Aí está parte dos bilhões
que as teles vão gastar, como compensação para essas emissoras. As outras
compensações ficariam por conta dos set-top boxes, os conversores digitais, que
devem ser dados para os quase 14 milhões de lares atendidos pelo bolsa família. As famílias carentes precisam do conversor para não ficarem sem TV, já que o sinal analógico vai ser desligado de uma vez antes do prazo previsto.
Finalmente, são necessários filtros de sinal em muitos lares, onde eventualmente o tráfego 4G
atrapalhe a sintonia de canais de TV. Isso é tudo que precisa acontecer para
que as teles possam, o quanto antes, massificar o 4G no Brasil. A questão é como
isso vai acontecer.
O edital publicado pela Anatel - encarregada de descascar o
abacaxi - determinou um leilão onde vão ser oferecidos três lotes para operar
4G em todo o Brasil (nacional), mais outros 3 lotes para operar, cada um deles,
em 3 regiões diferentes do país (regional). As empresas que ganharem devem, em
seguida, constituir a EAD - Entidade Administradora do Processo de
Redistribuição e Digitalização dos Canais de TV e RTV. Guarde bem o nome dessa
nova empresa, porque ela deve dar muito o que falar nos próximos anos! Tem
ainda um grupo que vai ser criado pela Anatel só para acompanhar toda a
transição. Vai ser o GIRED - Grupo de Implantação do Processo de Redistribuição
de Canais. O grupo vai ser formado por representantes da Anatel, do Ministério
das Comunicações, das empresas vencedoras do leilão e de entidades
representantes dos radiodifusores.
O edital exige que as empresas vencedoras constituam um
fundo de cerca de R$ 3,6 bilhões para a EAD. É esse dinheiro que vai pagar as
compensações para as emissoras de TV, os conversores que vão para as famílias
carentes, os filtros de frequência, estudos de qualidade do sinal e até
campanhas publicitárias para explicar à população o que está acontecendo. O
processo todo - concorrências públicas para compra de equipamentos,
conversores, filtros, contratação de especialistas, espaço publicitário, etc -
vai ser administrado pela EAD. Sempre sob a supervisão do GIRED, que terá a
responsabilidade de não deixar o abacaxi azedar.
Claro que é tudo muito complicado! Mas é o jeito que o governo encontrou
para fazer tantas coisas acontecerem de uma só vez. E ainda, faturar cerca de
R$ 8 bilhões com a venda das outorgas. Cada um dos três lotes nacionais e cada
um dos três lotes regionais representa uma outorga. O preço mínimo somado das 6
outorgas chega a mais de R$ 7,9 bilhões. Como cada outorga vai a leilão na base
do "quem dá mais", a concorrência entre os participantes deve levar a
soma dos valores a R$ 8 bilhões, segundo previsões do mercado. Isso é dinheiro
para o Governo Federal, pela concessão do serviço. Não tem nada a ver com os
outros R$ 3,6 bilhões que vão constituir o fundo da EAD, para pagar as
compensações.
A
grande disputa vai ser em cima dos 3 lotes nacionais. E, à época do
planejamento do edital, o grupo das teles estava formado pelas quatro
grandes
operadoras, Oi, Claro, Vivo e Tim. De algumas semanas para cá começaram
as
especulações em torno da venda da Tim, que seria dividida entre as
outras 3
grandes. E parece muito óbvio que é melhor pagar por áreas de exploração
de
serviço de telefonia e Internet móveis - dividindo a Tim - do que ver o
valor de cada outorga crescer lance a lance, numa disputa mais
concorrida no leilão. Esse parecia ser um dos motivos que estaria
levando as teles a tentar adiar o leilão, com
tantas contestações do edital. Elas estariam ganhando tempo para
primeiro
dividir a Tim entre elas, e depois entrarem no leilão sem disputas, com
uma
outorga nacional para cada empresa. Definitivamente, a tal concorrência
de mercado é algo que, no Brasil, sempre tentam sufocar.
Mas
na semana anterior ao leilão a concorrência ficou desenhada: a Tim
apareceu como uma das concorrentes, num confronto onde também sentam à
mesa Telefonica/Vivo, Claro e Algar
Telecom. A surpresa ficou por conta da Oi, que preferiu ficar fora do
leilão. Vale lembrar que o Brasil é um dos maiores
mercados do mundo em telecomunicação móvel, com potencial para elevar
valores
em qualquer disputa desse tipo.
O outro lado curioso desse grande
negócio público é a disposição do governo em levar adiante um empreendimento.
Nesse momento, os R$ 8 bilhões são fundamentais para fechar a conta do déficit
primário. Então a gente percebe que, no Brasil, quando um governo quer - seja
ele de qualquer corrente partidária - ele faz acontecer.
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