RELÍQUIAS DA LITERATURA DE NEGÓCIOS


Prepare-se para ver em breve um conto das arábias estampando as capas das principais revistas de economia do mundo. A versão vem turbinada com personagens japoneses e chineses, reunindo mais protagonistas de povos das antigas civilizações orientais. Um enredo cheio de disputas, perseverança, riscos e muita ambição.

De árabe, na verdade, essa história tem apenas o nome e a inspiração. O "conto" Alibaba vai trazer como personagem principal, nesta versão do mercado de capitais, uma operadora de comércio eletrônico, sediada na China. É o site Alibaba.com, que vende de tudo da China para o mundo pela Internet e agora vai fazer uma oferta pública inicial de ações (IPO). Deve acontecer ainda este ano, na Bolsa de Nova York. Os documentos exigidos já foram entregues para a comissão da bolsa que avalia os riscos financeiros para o mercado. Por enquanto, a expectativa é que a oferta alcance cifras superiores aos US$ 17,9 bilhões negociados pela VISA em 2008. A se confirmar, Alibaba vai virar lenda como o maior IPO da história da Bolsa de Nova York.

Nos jornais e revistas de perfil mais popular, o grande nome vai ser Jack Ma, um ex-professor de inglês de Hangzhou, uma cidade da China Oriental. Ele é o dono e fundador do site. Porém, nas publicações especializadas em economia e negócios, quem deve conseguir mais notoriedade será Masayoshi Son, Presidente do SoftBank japonês. Ele investiu, na hora certa, U$S 20 milhões na empresa de Jack Ma e se tornou dono de 34% da Alibaba.com. Isso foi há 14 anos, quando o site estava começando. Hoje, os analistas da Bloomberg avaliam que esse terço da operadora chinesa valha US$ 58 bilhões, quase 3 mil vezes o valor investido pelo banqueiro japonês.

O mercado financeiro gosta de histórias de pessoas espertas, que fazem as apostas certas. O chinês Jack não se encaixa exatamente neste perfil. Ele foi o cara que arregaçou as mangas e trabalhou duro na construção do seu negócio. Já o banqueiro Son tem todos os tics e talismãs que os players do mercado especulativo logo identificam entre os que fazem parte de seu gueto. As posições que ele mantém no mercado somam cotas de mais de 1300 empresas, sempre com foco na tecnologia. Dentre elas, a Yahoo! Japão, a Supercell, produtora de jogos da Finlândia que criou o Clash of Clans, a Brightstar, distribuidora de celulares dos Estados Unidos e o controle acionário da Sprint, a terceira maior operadora americana de celulares. É justamente nesse ramo onde o banqueiro japonês quer perpetuar a sua marca: ele sonha em ter a maior operadora de celulares do mundo, segundo afirmou Satoru Kikuchi, um analista de mercado de Tóquio. Os movimentos do investidor parecem confirmar o que diz o analista. O SoftBank estaria preparando uma oferta para adquirir a T-Mobile nos EUA.

Os cacoetes de investidor compulsivo marcam bem a história de Son, para delírio de fanáticos dos pits das maiores bolsas do mundo. Na bolha de empresas de tecnologia do começo do Século, ele perdeu dinheiro em negócios como o Buy.com e o grupo Webvan. Chorou os milhões perdidos ao mesmo tempo que dava de ombros para a rebeldia do mercado de papéis de tecnologia, e continuou garimpando na mesma lavra digital. A estratégia ele próprio chamou de Netbatsu, um apelido para o que seria a nova era econômica do Japão, sucedendo o período de conglomerados industriais, que ficou conhecido como Zaibatsu. Para ele, inovação tecnológica é o grande tesouro. Nas duas últimas décadas ele financiou centenas de startups de tecnologia e agora, com o IPO do Alibaba, ele deve se cacifar para, no mínimo, chegar muito próximo do seu sonho.

É nesse limiar de mito e realidade onde a história de Alibaba vai ser revivida na bolsa. No conto das Mil e uma Noites, o pobre lenhador Alibaba enriqueceu graças à sorte de ter encontrado o tesouro dos 40 ladrões. Mas ele precisou da esperteza da escrava Morgiana para liquidar todos seus inimigos. O chinês Jack pode ficar com parte do perfil de Alibaba, por ter perseverado tanto na busca de sua fortuna. No caso de Son, a esperteza de Morgiana é um ícone marcante.

O que, com certeza, não vai faltar nessa próxima versão da lenda é muita emoção! Para deixar a história mais característica, espera-se que investidores árabes tragam a liquidez dos seus petrodólares para o pregão. Isso pra quem aposta no final feliz. Afinal, na vida real nada sai exatamente como previsto e o mercado financeiro é o centro nervoso de épicos da história das fortunas.

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