AS FRANQUIAS CIBERNÉTICAS E O MENOR PREÇO


A gente está vendo aqui, encontra também perto daqui, longe daqui e ainda pelo meio do caminho. É aquela palavra inventada há pouco tempo, um neologismo, de base tecnológica. Cada vez mais presente nas pautas sindicais. Isso mesmo, “uberização”, ou até “desuberização” estão se tornando palavras de ordem na economia desses tempos.

O desafio agora é saber, tecnicamente, o que é uberização. “É essa mania de fazer aplicativo pra tudo que é serviço que depende de deslocamentos.” Talvez funcione como ideia mais genérica; “são formas de contratar serviços sem nenhum vínculo empregatício”. Verdadeiro na prática, juridicamente, não mais. Falta um conceito claro. Uma compreensão mais ampla desse fenômeno. Isso pode ajudar a lidar melhor com ele na sociedade contemporânea. Não vai ser aqui e agora que esse novo conceito vai ser enunciado. Mas algumas contribuições podem ser consideradas.

O Uber foi o primeiro sistema automatizado de gestão disponibilizado publicamente, para qualquer usuário. Forma um coletivo. Sistema automatizado, por definição, é aquele que não depende de ninguém. Não tem patrões. Quer dizer, dentre outras coisas, que ninguém é responsável por nada, nem por alguém. Os robôs virtuais sabem bem o que fazer pelo sistema. Do lado real, quem entra é para tentar explorar um determinado serviço. Algo parecido com uma franquia cibernética. As franquias reais, há mais ou menos meio século, começaram a espalhar pelo mundo produtos muito simples. Coisas associadas a paixões, como hambúrgueres, pizzas e roupas de grife. Agora, as franquias cibernéticas, vão mais para os serviços simples. E indispensáveis.

Outra característica típica desses sistemas está nas alterações que eles provocam na dimensão tempo-espaço. Não é à toa que relativizaram tudo. Quem presta o serviço escolhe quando trabalha e quando para. Quem precisa do serviço, terá aquele coletivo à disposição na hora que precisar. Redes de comunicação e algoritmos ligam essas duas pontas, sob as regras de um modelo de negócio simples. Regulamentação passa a ser um artifício inútil da burocracia. Até o preço que vai ser cobrado fica por conta dos robôs virtuais. Eles misturam muitos dados do próprio histórico, que registram permanentemente. Entrar no sistema significa disputar, de alguma forma, nano sopros daquele turbilhão de dinheiro, que surge da soma de “zilhões” de pequenos gastos do cotidiano.

Essas imensas corporações virtuais, cada vez mais cosmopolitas e onipresentes, ainda estão se inventando (ao contrário do resto do mundo, que vive o apelo para a reinvenção). Estão descobrindo os ativos que se formam em torno delas mesmas. Por exemplo, um grande mercado formado pelos seus prestadores. A ideia é explora-los, além do combinado no algoritmo.

Apresentado como um benefício, o Uber Chip é uma parceria com a Surf Telecom, uma operadora móvel virtual (MVNO). O plano tem algumas vantagens especiais. Não cobra nada durante o uso do Uber Driver, aplicativo da empresa para motoristas e entregadores. Uso de WhatsApp e Waze é ilimitado e tem ainda 9 GB de Internet/mês. O preço varia de acordo com a pontuação de cada motorista no programa de fidelidade da empresa. Vai ficar entre R$ 20,00 e R$ 35,00/mês. Outro benefício é o Uber Conta, em parceria com o banco Digio. Quem aderir, passa a receber o dinheiro na conta imediatamente após cada corrida. Não precisa esperar uma semana, como acontece hoje. Tem direito a uma certa quantidade de saques nos caixas do Banco 24 horas e TEDs. A exemplo da própria empresa, os benefícios são todos virtuais, não têm instalações físicas para atendimento de clientes.

Embora ninguém esteja falando em bisbilhotagem da empresa na vida de seus motoristas, é claro que essa proximidade acaba constrangendo mais ainda os parceiros que pensarem em receber “por fora”, corridas trazidas pelo Uber. A estratégia tende a aumentar o contingente de parceiros pelo mundo e, como consequência, novas possibilidades de negócio para a empresa nesse mercado em particular.  Esses benefícios estariam sendo lançados experimentalmente em São Paulo, para depois serem oferecidos em outras cidades do Brasil e do mundo.

Sistemas de gestão desse tipo estão crescendo, mudando a mobilidade urbana, o mercado automotivo, as alternativas para o mercado de trabalho. Uma presença admirável nas atividades econômicas, principalmente se considerar o pouco tempo de existência. Por fim, é importante destacar o principal apelo deles: o menor preço. Em nome desse paradigma, muitas empresas tradicionais estão desaparecendo. Desde grandes magazines até carrinho de cachorro quente. O apelo do menor preço deve “ser testado” até encontrar um limite. E se um dia chegar a isso, ninguém sabe quais serão as consequências.

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