ATÉ ONDE ISSO PODE CHEGAR?



Depois que o Reino Unido anunciou, na terça-feira, o banimento do 5G chinês Huawei, o que antes era mais uma briga comercial, passou a ser um problema preocupante. O episódio levanta questões que vão além de eventuais provas sobre o “boi chinês na linha do 5G” – a espionagem – ou sobre a efetiva participação do governo da China no controle da empresa.

Especialistas em rede consideram impossível 100% de segurança em qualquer sistema. E, quanto à mão de Xi-Jinping na Huawei – ou em qualquer outra importante empresa chinesa – não deve manter uma proximidade muito maior do que entre o governo americano e a Boeing, IBM e outras empresas estratégicas. Importante, agora, é saber por que nem o governo americano e nem o Vale do Silício se preocuparam em produzir um 5G nativo. Será que as agências de inteligência não sabiam o que se passava nos laboratórios chineses?

Já houve antes situações semelhantes de descaso da tecnologia americana, talvez esnobismo. A TV Digital, por exemplo. O Japão trabalhava há décadas num projeto, a Europa se mobilizava para ter um sistema próprio e os Estados Unidos pareciam dar de ombros para a questão. De repente, os americanos apostaram no pioneirismo, fizeram um sistema muito básico e colocaram a TV Digital em operação. O ATSC 1.0 era o pior sistema entre todos, mas era o único real, que existia, empresas e pessoas usavam. Vieram os sistemas europeu, o japonês, e os Estados Unidos ficaram com o título do pioneirismo em mãos. Depois trabalharam nas versões 2.0 e 3.0 do ATSC, essas sim, bastante avançadas. Pelo visto não adiantou muito, sistemas americanos DTV são os menos adotados no mundo.

Com a infraestrutura 5G tudo é muito diferente. Além do entretenimento, essa tecnologia abarca todos os setores da vida nos nossos dias. Vai da roça aos carros autônomos, passa pelo IoT, sistemas de pagamentos, educação, indústria 4.0, saúde, segurança, ... .

Os Estados Unidos não são de sentar na sarjeta e chorar por derrotas. Diante de ameaças – como alega o governo no caso do 5G Huawei – eles têm um vasto histórico de criar versões mais eficientes, melhores, e vencer competindo. Na corrida espacial Kennedy não se preocupou em difamar Yury Gagarin. Decidiu chacoalhar a Nasa, que correu com o bastão até entrega-lo nas mãos de Neil Armstrong, o primeiro humano a pisar em solo lunar.

É diante dessa estranha opção de esperneio, por parte dos americanos, que surge a questão mais preocupante: até onde isso pode chegar?

A pressão norte americana ficou evidente. Oliver Dowden, Secretário britânico para o assunto, pareceu dizer o que devia, sem esconder o quanto custava. Sobre a proibição de compra de equipamentos Huawei e ZTE a partir do ano que vem, o secretário afirmou que “isso vai atrasar a nossa implantação do 5G por mais de um ano e custará 500 milhões de libras (550 milhões de euros)”. Ainda de acordo com o site Teletime, sobre trocar, até 2027, todos os equipamentos do 5G chinês que já funcionam por lá, Dowden foi impactante: "O acumulado do atraso será de dois até três anos, e o custo de mais de 2 bilhões de libras. Isso vai trazer consequências, ( ... ) haverá ainda mais custos e atrasos". Essa tarefa, de banimento completo, cairá na conta das operadoras.

Ao final de suas palavras, Dowden disse que um estudo técnico apontou a necessidade das mudanças. Ora, na edição anterior deste blog, houve referência à citação de Paulo Guedes, que usou o Reino Unido como exemplo de uso seguro do 5G Huawei. Para ele, a limitação no uso no core e outros pontos delicados da rede foram considerados suficientes para impedir espionagem. Paulo Guedes parecia acreditar que seria o suficiente para conter a pressão americana. Agora, a realidade é que o parlamento inglês deve votar a lei até o final do ano, mudando tudo. Por aqui, a mobilização parece começar no sentido inverso. No dia seguinte ao anúncio britânico, Daniel Hajj, da AMX, controladora da Claro, disse não estar “... ouvindo nada hoje sobre banir a Huawei em outros países latino-americanos, vimos apenas alguma coisa no Brasil, mas nada formal do governo. É o único lugar". Sinal de que o desespero americano está servindo mais como propaganda da tecnologia chinesa.

Trump está tratando o 5G chinês como se fosse a venda de mísseis de longo alcance à nações inimigas. O risco de espionagem não seria comparável a tanto. O risco maior parece ser o econômico. Os Estados Unidos desfrutam do status de maior potência tecnológica desde a chegada à Lua. E os chineses estão chegando cada vez mais perto de tomar essa posição. Se essa postura se mantiver, com ou sem Trump na Casa Branca, a indústria tecnológica deve sofrer no mundo todo. Protocolos de cooperação, compartilhamento de componentes, tudo passa a ser ameaçado pela disputa comercial predatória. Melhor procurar saber onde se vendem pombos correios.

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