O PREÇO DA CIDADANIA EM BITs



Não vive sem um celular... Vive, sim! O insuportável é viver sem Internet, acessada principalmente pelo celular, que na verdade já é smartphone. Inicialmente alçada ao ról de frescuras contemporâneas, a conexão com a rede mundial de computadores pode ser hoje, de fato, uma necessidade fundamental. Defendida até pela Constituição de 88, promulgada antes do primeiro celular operar aqui no Brasil.

O raciocínio não é exigente e os tempos atuais facilitam mais ainda a compreensão. A Advogada Flávia Lefèvre, especialista em Direito Digital lembra que, numa situação de quarentena, o trabalho de muitas pessoas depende diretamente de conexão com a rede. Também as informações gerais sobre o mundo exterior ao confinamento, solução de questões pessoais, que vão e voltam pela banda larga. Informação, trabalho, ir e vir, são direitos essenciais garantidos pela Carta Magna. Deles, o cidadão não pode ser apartado.

Foi por esses motivos que OAB, Idec, coletivo Intervozes, Ministério Público Federal e outras entidades de peso enviaram um pedido para a Anatel. Queriam um compromisso das operadoras de telefonia (as teles) de que as conexões não seriam cortadas por falta de pagamento nesses próximos 3 meses. De acordo com o site Teletime, passados alguns dias, a resposta veio direto do MCTIC – Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, a quem a Anatel está vinculada: um sonoro não.

A pandemia do coronavírus fez aflorar no Brasil uma série de outras “epidemias” político-administrativas, como bem colocou o Jornalista Roberto Dias, Secretário de Redação da Folha de S. Paulo. Dentre as tantas podem ser incluídas as epidemias de revogação de decisões, de mudanças de posição, proibições vindas de esferas de poder não autorizadas. Por isso, se dentro de algumas horas o MCTIC voltar atrás, será mera reação epidêmica. Pode também sobrevir uma decisão judicial. A questão é que, em algum momento, cometeu-se o desatino de dar de ombros para esse estado de coisas.

Nesta semana a Argentina suspendeu os cortes em serviços de telefonia/dados, por falta de pagamento, por 180 dias. A Aneel, agência brasileira do setor energético, determinou que nenhum domicílio vai ter a energia cortada por inadimplemento. A tendência, na situação que vive o planeta, é essa. Por aqui, os defensores da medida lembram que os débitos não vão deixar de existir. Vão permanecer, para serem pagos após esse prazo de excepcionalidade. Afinal, há sérios indicadores de que muitos vão perder emprego, muitas pequenas e micro empresas já não faturam nada, a reação em cadeia na economia tende a ser complexa. Faz sentido pensar em deixar as principais dificuldades para quem tem mais força, quer dizer, mais capital. Eles têm de onde tirar e, se não o fizerem agora, depois não terão mercado a explorar.

A condição de carência vai surgindo aos poucos até onde não se esperava. O “Estadão”, para não demandar muitos dados, decidiu reduzir a taxa de compressão dos seus conteúdos. Em seguida o GloboPlay tomou a mesma iniciativa, para economizar quase metade dos dados utilizados em streaming de filmes e séries. Com isso, resoluções mais altas, como 4K e full HD, ficam temporariamente inacessíveis aos clientes. Tecnicamente, alguma diferença só vai ser notada em televisores com as maiores telas. Netflix, Youtube e Facebook estão tomando a mesma medida, dependendo apenas de solicitações dos países, normalmente, aqueles que têm as redes mais modestas.

As teles que operam no Brasil não estão demonstrando a solidariedade que se espera, numa pandemia tão grave como a que estamos a enfrentar. Começaram mal. Pela gigantismo que ostentam, pela proximidade diária com os órgãos governamentais, para elas tende a ser mais simples a compensação desses gastos emergenciais. Sem uma grande moratória global, a economia de todo o planeta não vai retomar o ritmo mais tarde. Garantias? Quem é capaz de afirmar o que pode acontecer com o mundo pós covid-19? Portanto, la garantia soy jo, e inclua nas muitas preces, pedidos para que as dívidas sejam honradas. Não parece sensato que as teles exijam debêntures ou cotas, como acionistas, dos bares de periferia, das papelarias, padarias.

A super demanda já chegou aos supermercados, que até agora se mantêm bem comportados, sem elevar preços, sem forçar desabastecimento para pressionar. No geral, os fornecedores de vários setores também estão mantendo essa responsabilidade. No caso das teles começam a ser observadas falhas nos serviços, que podem até estar dentro da normalidade, mas agora passa a assustar.

É bom que se diga, desde a privatização dos serviços de telefonia, essas empresas sempre contaram com uma especial boa vontade por parte de todos os governos. E, perante os clientes, o único destaque que sustentaram foi no ranking de reclamações. Vamos ver o que nos espera nos próximos dias.

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