DEPOIS QUE ACONTECE, TUDO TEM LÓGICA


Seria um bom momento para juntar os perrengues pelos quais está passando a Simba Content e concluir que “isso era evidente”. A empresa é uma joint venture que reúne a RedeTV!, o SBT e a Record e foi criada para dar mais peso a essas redes em negociações do setor.
Até agora essa união estratégica rendeu muito menos do que o pretendido para as emissoras e muito mais do que o previsto para os advogados. Um prato cheio para os arautos do apocalipse, aqueles que gostam de dizer que “estava na cara que iria dar nisso”. Mas a saga da Simba mais parece uma rica experiência empresarial que, por enquanto, está longe de ser um fracasso.
No início da articulação a Simba enfrentou a acusação de cartel. A proposta foi aprimorada com o compromisso da produção de conteúdo e outros itens no objeto da nova empresa.
Com a nova legislação da TV Digital a empresa viu uma brecha para negociar um preço para exibição de suas três redes no line up das TVs por assinatura. Agiu profissionalmente e contratou um especialista em grandes negociações. A estratégia adotada foi contundente. Estabeleceu-se um valor de R$ 15,00 por assinante e fecharam os sinais da Simba nas operadoras, até que concordassem em pagar o valor.
De imediato, o resultado prático foi perda de audiência, negativas por parte de órgãos reguladores e de defesa do consumidor e um solene silêncio da preferência pública. Mas o aparente fracasso não se confirma ao aprofundar a análise.
A primeira evidência de sucesso está na coesão da aliança. Afinal, veio a tempestade e não houve pânico na condução do barco. No mais, as emissoras ousaram, se colocaram publicamente e hoje conhecem muito melhor o mercado onde atuam. Sem ousadia fica muito difícil inovar. E as três redes se lançaram a uma experiência inédita no Brasil. O retorno financeiro do empreendimento já começa a aparecer.

CONTINUA NA MESA

Diante das dificuldades a Simba demitiu o Executivo especializado em negociações e adotou outra estratégia. Há alguns meses conseguiu fechar um primeiro contrato, com a Vivo TV. No lugar dos R$ 15,00 ficaram “alguns centavos” por assinante. É muito pouco, mas já é algum retorno, sem dispender nem um real a mais. Com valores da mesma ordem, mais recentemente foi fechado outro contrato, com a America Movil (Claro, Net e Embratel). José Felix, presidente da nova cliente da Simba, falou sobre o assunto durante esta semana no Painel Telebrasil 2017, um evento realizado pela Associação Brasileira de Telecomunicações. Para Felix, a Simba “caiu na realidade” e ambas as partes abriram mão de premissas iniciais.
Regateou um pouco, ao dizer que não sabe por quanto tempo vai manter o acordo: “-um sinal que está no ar não tem que ser pago”. A afirmação é lógica... ou não. No sofá, berço esplêndido do telespectador, a troca de controle remoto é uma operação demasiadamente complexa e penosa, que não se encaixa no hábito de zapear. Tanto é que, por essa mesma lógica, as operadoras de TV por assinatura pagam para as emissoras Globo pela exibição do sinal. Não querem correr o risco de ver o telespectador se acomodar com o controle remoto do sinal aberto nas mãos, só para ver a campeã de audiência.
Porém, se as emissoras em questão, de fato, caíram “na realidade”, é algo que vai se revelar em outra situação. Elas já entenderam que as operadoras por assinatura não vão render o suficiente para dobrar o faturamento de cada uma delas. Falta agora despertarem para o mercado de novos conteúdos, cuja produção foi um compromisso assumido desde a fundação da Simba Content.
A expansão na produção de conteúdo ainda não vê limites. Ao contrário, o que está acontecendo são inversões antes descabidas para o contexto do audiovisual. Iniciativas inesperadas de produção, como no caso da Netflix, estão tornando o investimento em TV mais atraente do que no cinema. É o que se depreende dos rumos tomados por alguns produtores e atores de grande sucesso.
E, mais uma vez, é necessário lembrar, como em outros artigos deste blog, a variável tecnológica. O sinal da TV aberta não tem mais diferença em relação ao que chega pelo canal pago. A Internet vai continuar crescendo e as operadoras de telefonia estudam novos meios de recuperar faturamento, depois da queda imposta pelos aplicativos OTT. De repente as teles resolvem “meter a colher” no mercado de produção de conteúdo. Talvez para diferenciar sua oferta de TV por assinatura. Uma briga que só vai fazer aumentar as perspectivas para os produtores de conteúdo. Esta é a grande realidade.

SE AINDA PARECE POUCO...

Antes mesmo de constituírem a Simba, RedeTV!, SBT e Record se juntaram num outro empreendimento. Fizeram um acordo com a GfK alemã para trazer ao Brasil uma medição de audiência mais precisa e mais qualificada do que a do Kantar Ibope Media.
As negociações começaram em 2013 e ficou estabelecido que a empresa estaria apresentando seus relatórios de audiência a partir de maio de 2015. Como parte do acordo as emissoras iriam investir, juntas, mais de R$ 300 milhões.
A data estabelecida foi apenas o início dos problemas. Segundo representantes das emissoras a GfK demorou um ano além do prazo para começar a medir audiência. As metas de qualidade do serviço, como a porcentagem de aparelhos medidores ligados permanentemente, não teriam sido cumpridas e reclama-se até do painel de medição, que não reproduz com fidelidade o perfil sócio econômico da população brasileira. Outra reclamação é de que, no geral, os números apresentados pela GfK não eram significativamente diferentes do que relata o Ibope.
As emissoras teriam pago apenas R$ 40 milhões do total combinado e a gota d’água para o rompimento teria sido uma cobrança extrajudicial de pagamento por parte da GfK. A Record foi a primeira a entrar na Justiça. O Juiz Rogerio Marrone de Castro Sampaio já deu prazo para o instituto pagar quase R$ 28 milhões para a emissora. A expectativa é de que, com as ações a serem ajuizadas por RedeTV! e SBT a GfK tenha que pagar mais de R$ 100 milhões a título de indenizações por não cumprimento de contrato e devolução de valores pagos sem a devida contraprestação de serviços.
Por conta dos entreveros a GfK deve encerrar seus negócios no Brasil. Na última quinta-feira foram demitidos 149 funcionários, praticamente todo o efetivo da companhia.
É mais um desafio a ser enfrentado neste ano pelas redes acionistas da Simba. Fica a lição de que, o desejo de ver números diferentes de audiência, passa mais por investir na produção de conteúdo do que nas metodologias de medição.

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