VOCÊ VIRTUAL, O GRANDE NEGÓCIO DESSES TEMPOS


O fato é verídico. Aconteceu entre o final da década de 60 e início dos anos 70. O “milagre brasileiro” colocava muitos carros nacionais nas ruas, falava-se em TV em cores, carrinhos guiados com controle remoto. Viva a tecnologia! Ao Norte, a Transamazônica invadia mansamente os cofres públicos e a floresta, para marcar uma nova fase de desbravamento. Várias tribos tiveram um primeiro contato com o civilização naquela época.

Representantes de uma delas, já acostumados a usar calças de brim coringa, foram convidados a ir para São Paulo, conhecer o outro mundo. Antropólogos explicavam as “pajelanças” do homem branco, que mudaram tão drasticamente o ambiente. Viram edifícios, automóveis, grandes avenidas, telefone, TV, energia elétrica, etc. Passados alguns dias, em conversa com jornalistas, um deles perguntou a um dos índios o que mais o havia encantado na civilização, o que ele gostaria de levar para sua tribo. Pensou – só um pouco – andou até o fundo da sala e apontou uma torneira. O índio sabe a importância da água e o peso de transporta-la. Aquela maquininha que jorrava de forma tão simples foi, para ele, o milagre mais convincente dos brasileiros civilizados. Ele não sabia a grandeza e a complexidade que, da torneira para trás, traziam a água limpa até o lavabo.

Uga, uga, agora é nossa vez. As grandes soluções tecnológicas estão aparecendo assim na vida civilizada. Tem uma aparência simples pra quem usa, mas mobilizam estruturas de alta complexidade tecnológica. E conquistam valores surpreendentes no mercado.

GIGA DÓLARES, POR UM MUNDO DE GIGABYTES


A Microsoft pagou, em 2013, US$ 7,2 bilhões pela Nokia, uma das marcas de celular mais bem posicionadas no mercado. Dois anos antes ela mesma tinha pago US$ 8,5 bilhões pelo Skype. Ora, uma fábrica de celulares exige projetos sofisticados, microchips avançados, com zilhões de componentes microscópicos. Muitas máquinas de altíssima precisão, um capital gigantesco investido em instalações, logística, mão de obra altamente qualificada, pesquisa e desenvolvimento permanentes para acompanhar a concorrência. A gente vê na mão, quando pega um celular, os indícios de toda essa complexidade. Já o Skype, que custou mais caro, é muito mais simples para quem abre o aplicativo. Parece apenas uma das formas de usar toda essa tecnologia. A verdade é que a produção de um software que transforma um computador num vídeo fone envolve muita inteligência. O capital instalado para cria-lo são microcomputadores e alguns periféricos. Depois de pronto se multiplica quase que sozinho. Mas toda uma estrutura altamente complexa precisa ser mantida e atualizada, longe porém, dos olhos de quem já se acostumou a simplesmente acessar a Internet.

No começo deste mês a mesma Microsoft fechou a compra da rede social de profissionais LinkedIn por US$ 26,2 bilhões. É mais do que o triplo do que foi pago na compra da Nokia. Quase toda a tecnologia envolvida no desenvolvimento da interface de uma rede social é algo que há muito tempo já estava disponível. Precisa muita criatividade para reunir tudo de uma maneira diferente, de forma a tornar aquele novo espaço virtual tão atraente e tão útil. É coisa para pessoas desligadas, como aqueles índios da Era Hippye, que se encantaram com o mais simples dos milagres brasileiros. Bom que nem pensem na complexidade que existe por trás do aplicativo.

OLHA O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO


Sempre teve assunto de trabalho e assunto entre amigos. Hoje temos as redes sociais para os amigos, onde o Facebook é o exemplo onipresente. O LinkedIn é a rede social do trabalho, do lado profissional. Por falar em Facebook, taí algo que aconteceu contra todos os paradigmas de então. Os primeiros bilionários digitais faziam um tipo prodígio, o gênio que se revelava. Foi assim com Steve Jobs e Bill Gates, pra citar os mais conhecidos. De fato, o que eles trouxeram ao mercado surpreendeu todo mundo, mudou sistemas de produção, rotinas de trabalho, coisas que balançaram os telhados. E o Facebook? O dono usou um modelo feito por um grupo de colegas de universidade, pôs os amigos pra trabalhar por ele – inclusive um brasileiro – e depois ficou com a torneira de dólares no colo. Ao conectar o engenho à Internet, o sucesso foi tanto que precisou desenvolver uma estrutura muito complexa, pra ligar tanta gente, de um modo tão simples.

O mundo está se reconstruindo assim, habitando a memória eletrônica. Amigos nessas redes sociais, trabalho nessas outras. A praxe é free – pelo menos no começo – pra inverter a lógica tradicional. É o caso do WhatsApp, foi assim com o Snapchat – que já começa a ser pago indiretamente, pela publicidade – e outros aplicativos que prestam serviços sérios, ou apenas divertidos. Parece que o objetivo é só atrair cada vez mais pessoas para o mundo on-line, o máximo de tempo possível. Jazidas de bits são vendidas a preço de diamantes e você fica cada dia mais virtual. Um dia, os antropólogos vão ter de encontrar explicações mais consistentes para esta migração em massa de nativos civilizados, para os domínios digitais.

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