A APOLOGIA POSSÍVEL À GUERRA




Depois do bang bang à italiana chegou a vez de um cowboy chinês assombrar os sonhos dominadores do Oeste Americano. Esqueçam o personagem "Gafanhoto", da série Kung Fu, que veio apenas para contrapor o silêncio e o desapego material à ambição dos conquistadores ianques. Era pura Filosofia Oriental, em plena Década de 1970. Mas o mandarim de agora chega online, invadindo fronteiras e disputando cada dólar que passa pelo e-commerce no mundo.

São muitas as maneiras de comparar o potencial do Alibaba.com, o maior portal de comércio eletrônico chinês, como os concorrentes americanos. Entre as comparações mais representativas está o volume de mercadorias vendidas. Em 2013, o Alibaba movimentou US$ 248 bilhões, o dobro da Amazon ou o triplo do EBay. Se contadas as embalagens entregues, são cerca de 5 bilhões de unidades, superando a marca da UPS, a gigante americana de logística, que entregou cerca de 4,3 bilhões de pacotes e documentos no ano passado.

A oferta pública de ações - ou IPO, na sigla em inglês - do Alibaba.com está numa contagem regressiva virtual. A data ainda não está agendada mas o mercado já tem como certas duas marcas históricas importantes: a primeira deve ser o maior IPO da New York Stocks Exchange, superando os US$ 20 bilhões em negócios, numa transação nunca antes vista no mercado financeiro norte americano; a segunda deve ser o fim do domínio americano no comércio eletrônico mundial.

A origem desse sucesso tem algumas razões em comum. Talvez a principal delas seja um mercado local vigoroso, combinado com uma rede de infraestrutura eficiente. A China, com uma população suficiente para povoar Marte, anuncia hoje uma classe média em torno de 500 milhões de pessoas. Se for a metade disso já é muito dinheiro em circulação. Também nos Estados Unidos foi o mercado interno que deu força a esses tipos de empreendimentos, inéditos à época.

Outro fator importante para competir nesse nível deve ser o "topete", aquela visão global associada ao ímpeto de avançar e conquistar, de se pôr à prova e lutar para vencer. Atributos americanos que os chineses cada vez mais querem igualmente provar. A diferença é que os marxistas doutrinados por Mao Tse Tung, ao contrário dos bolcheviques russos, adotaram como campo de batalha o livre mercado, o "consumismo alienante", desfraldando a bandeira vermelha numa guerra nada fria, ao contrário, capaz de aquecer os mercados. Para se ter uma ideia do espírito guerreiro que envolve essa disputa comercial, a ordem unida das forças chinesas tomou como estratégia de recursos humanos os romances populares de artes marciais de Louis Cha Leung-yung. O fundador do Alibaba, Jack Ma, é fã do gênero literário e adotou para si, dentro da empresa, o nome de Feng Qingyang, um guru de kung fu em uma das publicações. Ele sugere aos seus empregados que adotem a identidade de algum dos personagens das histórias, com direito a ostenta-la no próprio crachá e no cartão de visitas.

Porém, a característica comum decisiva de chineses e americanos nessa disputa é a determinação de inovar. A diferenciação, principalmente nos modelos de negócios, é a chave que abre as portas do sucesso para ambos os lados. O Alibaba.com já desenvolveu novas formas de dar credibilidade a este mercado impessoal num país como a China, onde olhar nos olhos sempre foi o primeiro passo para se fechar um negócio. Criou plataformas para setores específicos de comércio, como matérias primas e acessórios para pequenas empresas. E desenvolveu critérios de pagamento diferentes, atendendo realidades de diferentes segmentos de negócios.

A grande vantagem de uma guerra comercial é que ela sempre produz mais vencedores do que perdedores. Sim, porque no campo dos negócios a paz é um mal sinal. Ela só existe quando um grupo de poderosos, tratados entre si num cartel, decidem comodamente como explorar o mercado. Porém, quando a concorrência põe em guerra as forças comerciais os preços baixam, a qualidade sobe e o respeito pelo consumidor também. Tanto que o gigante do e-commerce chinês já tem planos de levar ao seu mercado tradicional os produtos americanos, o que representa uma vantagem para o Tio Sam. A proposta do que está sendo chamado de comércio transfronteiriço é um mercado global para consumidores globais. Isso tende a fazer com que os preços do iPhone sejam os mesmos tanto na Europa como nos Estados Unidos. Caso contrário, um clique muda o país de onde o consumidor vai comprar. A sazonalidade de botinas para neve desapareceria, mudando apenas o Hemisfério onde a maior parte das entregas seria feita.

A inteligência não conhece fronteiras. E destruir um adversário com violência é exatamente a confissão do fim da inteligência. As disputas e lutas, enquanto estiverem no campo da inteligência, nunca vão se transformar em tragédias.

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